A ponte das artes entre a Suíça e Portugal

Posted on 4/10/2011 by UNITED PHOTO PRESS

Biberstein está radicado em Portugal há 32 anos
(swissinfo)
“Aqui e além” é a exposição que reúne os artistas Michael Biberstein e Rui Sanches, no Pavilhão Branco do Museu da Cidade de Lisboa, em torno do tema da paisagem.

A partir do encontro da obra dos artistas, ao espectador é permitido desfrutar do diálogo criado entre os dois corpos de trabalho.

Constituída por seis pinturas do suíço Michael Biberstein, quatro esculturas do português Rui Sanches e a peça “Aqui e além”, assinada pelos dois, que resulta da colaboração inédita feita entre os artistas e pensada propositadamente para o espaço, a exposição oferece a construção de uma leitura em fusão com as características singulares do pavilhão e com o espaço envolvente.

Comunicar através da paisagem

O tema da paisagem, que sempre foi o assunto central da pintura abstrata de Biberstein, é representado, agora, com um teor mais efémero e mais atmosférico. Para o pintor “agora as coisas são, talvez, um bocadinho mais efémeras, mais atmosféricas. Têm mais cores, têm menos indicadores exatos de paisagem. São mais difusas. Mas ainda se vê uma paisagem.” Acrescentando que, desde a última vez que expôs em Lisboa, na galeria Cristina Guerra, “houve pequenas alterações. Sempre há. Mas nada revolucionário.”

O conjunto de obras que Rui Sanches elaborou para a exposição, mais do que é costume no seu trabalho, revela um caráter paisagístico Uma produção que o escultor reconhece ter “referências óbvias a paisagens, a horizontes e montanhas”. O que pode ser considerado como elemento catalítico no “diálogo com as peças do Michael.”

John Coltrane e Alentejo

“Eu penso que o facto de estar parcialmente fixado no Alentejo, isso tem-se refletido no meu trabalho”, revela Rui Sanches. “Essa questão de dar maior atenção à paisagem tem, com certeza, que ver com o facto de eu estar agora muito mais perto desse ambiente natural, pelo menos durante uma parte do ano.”
Para Michael Bieberstein, radicado em Portugal há 32 anos e a viver atualmente no Alentejo, a música é o elemento crucial no processo criativo. A sua banda sonora de eleição é aquela que tem a assinatura do músico de jazz John Coltrane. “Eu utilizo muito John Coltrane. Adoro!”

A paixão pela música de John Coltrane, a principio, era fácil de reconhecer no documentário que o realizador Fernando Lopes fez sobre o artista suíço e o seu trabalho (Michael Biberstein: O meu amigo Mike ao trabalho), mas “como a Impulse Records não cedeu os direitos, foi preciso substituir a música dentro do filme.”

Conta Biberstein que o som de Coltrane foi, então, substituído pelo grupo português Norman. “É um grupo fabuloso de jazz-rock” composto por “um guitarrista fantástico que é o Norberto Lobo, de nível mundial, o baterista é o João Lobo, também muito forte, e nos teclados está o Manuel Mesquita. Chamam-se Norman e é um grupo muito, muito bom.”

Colaboração rara

Uma amizade de vários anos e a afinidade artística entre os dois criadores, foram os elementos que permitiram reunir no mesmo espaço duas formas distintas de abordar um mesmo tema e fazer nascer a obra “Aqui e além”.

A exposição nasceu “com o respeito mutuo que nós temos um pelo outro, com o respeito que temos pelo trabalho de cada um”, afirma Biberstein. “O Rui também trata o assunto da paisagem, só que com uma linguagem totalmente diferente. Mas também com um certo sossego, com uma certa calma.“

“Somos amigos há muitos anos e várias vezes falámos em fazermos um projeto conjunto.” revela Rui Sanches. “Gostamos muito do trabalho um do outro. Agora, houve algo que fez despoletar este projeto e estamos aqui juntos neste espaço da Câmara.”

“Foi uma troca através das escolhas que fizemos das obras, das propostas que fizemos da ocupação do espaço e da montagem da exposição. Tudo isso foi feito em colaboração, mas o trabalho de cada um foi completamente autónomo e respeitado”, conclui.

Sobre a peça “Aqui e além”, cuja autoria é partilhada pelos dois artistas, Biberstein considera que “é bastante raro haver uma colaboração de trabalho assim,” mas “foi bom!”. E explica: “Aqui e além” surge de uma escultura de Rui Sanches que “é uma pequena casa, onde se pode entrar e, uma vez dentro dessa casa, vê-se uma abertura. Através daquela abertura ele (Rui Sanches) queria ver uma pintura minha, e eu pensei nisso. E sugeriu fazermos uma colaboração. Então, eu fiz uma pintura para esta peça e surgiu esta obra que é uma colaboração. Uma peça assinada pelos dois.”

Pavilhão Branco

Usufruindo de “uma situação fabulosa,” no jardim de um palácio setecentista habitado por famílias de pavões, o Pavilhão Branco é, nas palavras do pintor suíço, “muito bonito. Foi um grande prazer” fazer a exposição neste espaço.

“O Pavilhão Branco tem uma arquitetura minimalista e tem muita luz, o que para as minhas pinturas é muito favorável. As minhas pinturas são feitas de muitas camadas de cores diferentes. São camadas muito diluídas. Portanto, quando a luz muda a pintura também muda. Dependendo se se vê a exposição de manhã ou de tarde, pode-se ver uma exposição bastante diferente,” esclarece Biberstein.

Rui Sanches já tinha realizado uma exposição no pavilhão, no final dos anos noventa, mas Michael Biberstein nunca tinha exposto neste espaço. Por isso, quando a dupla considerou o Pavilhão Branco como “o espaço ideal para fazerem essa exposição”, o Chefe de Divisão de Galerias e Ateliers da Câmara Municipal de Lisboa, João Mourão, viu aqui uma “excelente oportunidade de ter o Michael Biberstein.” E assim permitir o “reencontro com a obra dos dois artistas, mas numa interacção diferente.” Para João Mourão, “o que existe aqui é a criação de um diálogo muito importante.”

“Há imenso tempo que achávamos que o trabalho do Michael Bieberstein se adaptava perfeitamente às características do Pavilhão Branco e que era uma lacuna ele ainda não ter passado pelo Pavilhão. Foi nesse sentido que aconteceu a exposição e a oportunidade de mostrar a obra,” concluiu João Mourão.

Luís Guita