Arte e alucinação | SÍNDROME DE STENDHAL

Posted on 1/03/2010 by UNITED PHOTO PRESS

Arte e alucinação pode causar fortes reações físicas e mentais a obras marcantes.


Sorriso introspectivo ou seriedade enigmática? Expressão tímida ou semblante discretamente sedutor? Em um episódio recente, se a Mona Lisa tivesse a habilidade de se expressar, certamente ganharia uma fisionomia bem diferente daquela que encanta e confunde no Museu do Louvre, em Paris. A obra mais famosa de Leonardo da Vinci foi alvo de uma caneca arremessada por uma visitante russa. Depois de deter a jovem que atacou o quadro, a polícia parisiense a transferiu para um hospital psiquiátrico. Logo começaram a surgir informações sobre a hipótese de a moça ter sido vítima da síndrome de Stendhal.

Aceleração cardíaca, tonturas, confusão mental, angústia e até alucinações são manifestações desse mal súbito e raro, que tem intrigado neurologistas e psiquiatras especialmente na Europa, onde acontecem os surtos de que se tem notícia.

A síndrome foi descrita pela psiquiatra italiana Graziella Magherini, em 1989. A médica a definiu como um conjunto de sintomas que acometem indivíduos psicologicamente equilibrados no momento em que contemplam obras de arte com características marcantes. “Nas décadas de 1980 e 1990, eu era responsável pelo serviço de saúde mental do Hospital de Santa Maria Novella, em Florença. Com meus colegas, comecei a perceber a recorrência de casos de emergência de pessoas afetadas por um distúrbio psíquico repentino”, descreveu a psiquiatra no livro que publicou sobre a síndrome, La Sindrome di Stendhal. “Estudando cada um deles, identificamos alguns elementos em comum nessas pessoas, todas portadoras de grande sensibilidade emocional, que tiveram contato com obras de arte e que eram turistas estrangeiros”, relatou na publicação.

No Brasil, poucos médicos conhecem a síndrome. De acordo com o neurocirurgião Edson Amâncio, o desconhecimento pode estar relacionado ao fato de o distúrbio não estar catalogado no Manual de Diagnóstico e Estatística de Doenças Mentais, bíblia da psiquiatria americana.

– Sei de brasileiros que passaram pela situação contemplando obras na Europa. Eu próprio vivenciei os sintomas diante do quadro Cristo Morto, do pintor renascentista alemão Hans Holbein, o Jovem, no Museu da Basileia, na Suíça. Essa relíquia também provocou sensações perturbadoras no escritor russo Fiodor Dostoiévski – observa o neurologista.

Amâncio diz conhecer relatos de pessoas que permaneceram no interior de museus que guardam grandes trabalhos em uma espécie de sonambulismo:

– Alguns ficam estáticos diante de quadros ou esculturas num pranto silencioso. Em geral, as vítimas perdem a noção do tempo e do local.

O neurologista e professor da Universidade Federal do Paraná Hélio Teive sofreu por alguns minutos os sintomas da síndrome de Stendhal durante uma visita à Capela Sistina, no Vaticano.

– Diante do teto da capela, obra primorosa de Michelângelo, senti algo muito fugaz, mas que me deixou fora de mim. Fui tomado por taquicardia, tontura e uma ansiedade muito forte – relata Hélio.

Saiba o que é o Síndrome de Dtendhal aqui
Recuperação rápida

> Os episódios de mal-estar característicos da síndrome não parecem ter consequências graves. Um pouco de repouso, a proximidade com algo familiar ou a ingestão de tranquilizantes leves contornam o distúrbio.

> Segundo a psiquiatra italiana Graziella Magherini, autora de pesquisa sobre o assunto, o espectro de sintomas é bem variado. Algumas pessoas sofrem com alucinações e alteração de percepção, outras manifestam desequilíbrio afetivo ou depressão. Angústia ou ataques de pânico também podem ocorrer.

> Durante seus 10 anos de observação, Graziella verificou que a remissão rápida dos sinais é frequente, mas aqueles portadores que apresentaram dissociações psicóticas, mania de perseguição ou alucinações têm sete vezes mais chances de não se recuperar rapidamente.